sábado, 20 de agosto de 2011

Candomblé e racismo sem cegueira!


Fazer qualquer tipo de referência pejorativa ao candomblé é encarado pelas pessoas do movimento negro como ato de racismo e preconceito religioso, mas principalmente racismo. No entanto, como acontece com boa parte dessas pessoas do movimento, só conseguem enxergar um lado da moeda, o lado que lhes convém.

Em relação ao candomblé, existe sim muita discriminação racial atrelada à religião, mas não simplesmente, existem mais questões por trás disso. Deve-se fazer um mínimo de esforço para sair do simplismo exacerbado e da cegueira ideológica institucionalizada. Muito se fala a respeito dos rituais ou trabalhos feitos no candomblé com intuitos pejorativos, com intenção de prejudicar uma pessoa ou uma instituição normalmente, mas podendo ter outras funções. São conhecidos vulgarmente como macumba ou rituais de magia negra. O argumento que se usa para refutar isso é de que não existe esse tipo de ritual na teologia do candomblé, mas sim na religião kiumbanda, que é uma vertente da Umbanda (religião brasileira que tem como peculiaridade o sincretismo entre religiões africanas, catolicismo e espiritismo). Fazendo uma breve pesquisa observei que realmente é verdade, o problema é que o campo prático é completamente diferente do campo teológico. No campo concreto o que se observa é uma inserção de práticas da religião kiumbanda (ou práticas similares) de forma incisiva no candomblé, de modo que tais práticas são exercidas de forma muito comum dentro da religião. Em suma, existem pais e mães de santo que praticam (normalmente vendem) rituais de magia negra, e não se trata de algo residual.

A quantidade de relatos nesse sentido de pessoas que foram ligadas ao candomblé não está no gibi, já ouvi diversos, e isso mancha e muito a imagem do candomblé. Muitas pessoas do candomblé também tem ligação com a Kiumbanda, ou não tem ligação mas exercem práticas similares. Isso é muito representativo, e não deve ser tratado como uma “externalidade”. A grande maioria das pessoas não vai ao Google pesquisar sobre isso, elas escutam os relatos e internalizam, então dizer que a aversão em relação ao candomblé não passa de racismo é um discurso reducionista, simplório e altamente conveniente. Em grande medida essa aversão é resultado da fluidez das fronteiras entre candomblé e kiumbanda, de modo que essa separação é complicada ou até ilusória. O que me motivou a escrever esse texto hoje inclusive, foi mais um relato que escutei, sobre uma pessoa ligada ao candomblé que em um desentendimento ameaçou encomendar trabalhos malignos para a pessoa com a qual se desentendeu.

E por favor, não me venham com esse discurso ridículo de relativizar o mal, como alguns usam: “Ah, o conceito de mal é relativo, depende da cultura!”. Se o mal é relativo meu amigo, então você não deveria lutar por causa nenhuma, porque se poderia então dizer que a própria discriminação pode ser algo bom. Quem realiza qualquer tipo de ação com intuito de prejudicar terceiros está praticando o mal e acabou, se quer relativizar isso o sanatório é o lugar mais indicado para fazer.

4 comentários:

  1. O último parágrafo é lindo. :p

    Vivemos um momento em que se pode criticar a incoerência da Igreja Católica com alguma liberdade. O mesmo para aqueles pastores mercenários que fundam suas igrejas pelo Brasil afora. O fanatismo religioso por parte de alguns cristãos é também censurado e tratado como um dos fatores responsáveis pela ignorância que se perpetua na nossa sociedade.

    Tudo isso pode ser criticado livremente, sem nada que desabone as tais críticas. Mas qualquer crítica ao candomblé vira racismo, né? Oh, coitadinhos...


    P.S. Sou atéia.

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  2. Haha, legal. Mas ainda acho que a ideia de bem e mal é completamente "relativa". Depende totalmente da cultura onde cada situação está inserida. Muito bom Phóris.

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  3. Maranhas .... o que eu quis dizer é o seguinte: Uma pessoa do movimento negro está imbuída de um sistema de valores muito forte, de modo que eles definem claramente o que é racismo e o que não é, e o que deve ou não ser feito em termos de políticas públicas para atenuar isso. Nesse sentido, eles tem como um "valor base" a questão de que o racismo e o preconceito são ruins, ou seja, quem usa um discurso encharcado de valores não tem moral nenhuma para usar a total relativização dos valores como argumento. Até porque a total relativização de valores leva ao "vácuo", ou seja, tudo perde o sentido, pq tudo pode ser questionado.

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  4. Muito bom esse texto!

    Só gostaria de esmiuçar/completar dizendo que a questão do bem e do mal não me parece nada relativa. Tudo que prejudica alguém "inocente" ou lhe aprisiona, ou lhe manipula eu considero como mal. E se alguém deve passar por um "mal" para ser punido, tem que ter um cunho intenso pedagógico, ou seja, para ensinar que aquilo não se faz.
    Com relação a Candomblecistas ou Kiumbandistas fazerem o mal, isso só depende do caráter, da evolução espiritual de cada indivíduo. Quem faz o mal, o faz no catolicismo, no protestantismo, no kardecismo, na umbanda, na Kimbanda, no dia a dia. Kimbanda, pelo que sei é uma gira de esquerda, e para quem não conhece, é importante dizer que Exús e Bombojiras são pessoas que atuam num dos lados da criação, e que fazem o bem. Quem faz o mal, ou aceita presentes para favorecer uns e detrimentos de outros, jamais podemos chamar Exú ou Bombojira. Quem faz isso tem outro nome. Essa é só a minha opinião depois desses 21 anos de Umbanda.

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